terça-feira, 14 de agosto de 2012

DIETA E ACNE: VERDADE OU MITO ?!





    A acne vulgar e dermatose crônica. Doença do folículo pilos sebáceo, ela tem quatro fatores etiopatogênicos fundamentais: hiperprodução sebácea, hiperqueratinização folicular, aumento da colonização por Propionibacterium acnes e inflamação dérmica periglandular. A prevalência geral da acne varia entre 35% e 90% nos adolescentes; no ocidente, e de 79% a 95% nessa mesma faixa etária. Observa-se, frequentemente, que a acne acomete 95% dos meninos e 83% das meninas com 16 anos de idade e pode chegar a 100% em ambos os sexos. Seu aparecimento e prevalência são maiores entre os pacientes do sexo masculino, graças a influencia androgênica. A doença que sofre importante impacto genético, o qual se da, somente, sobre o controle hormonal, a hiperqueratinização folicular e a secreção sebácea.

      Quanto à teoria da associação de fatores ambientais e acne, o sebo talvez seja o componente mais afetado. Nessa situação, um possível estado hiperinsulinêmico, associado à presença secundaria do fator de crescimento insulina-simile 1 (IGF-1), estimularia a síntese de andrógenos por vários tecidos do corpo, os quais, sabidamente, estimulam a produção de sebo.

OBESIDADE E ACNE

Embora sem comprovação concreta, muitas pessoas tem a impressão de que acne e obesidade se relacionam. Um grande estudo avaliou 2.720 militares recrutados por obesidade e acne e notou-se tal associação apenas em dois indivíduos, com idades entre 20 e 40 anos, e nenhuma associação entre os que tinham entre 15 e 19 anos. Isso sugere que a acne, numa população mais jovem, possa estar relacionada a outros fatores além da obesidade e da resistência insulínica.

OCIDENTALIZAÇÃO DIETÉTICA E ACNE

Em um estudo no qual se avaliaram mais de 1.200 indivíduos de duas sociedades não ocidentalizadas, atribui-se a ausência de acne nessas populações ao seu padrão alimentar. Em suas dietas ha, substancialmente, baixo índice glicêmico em comparação com as dietas ocidentais. Em estudos epidemiológicos com a população de esquimós Inuit, detectou-se que os mesmos não apresentavam tal dermatose ate a introdução dos hábitos alimentares ocidentalizados. Outros estudos, realizados com populações que viviam em vilas de área rural, como as residentes do Quênia, de Zâmbia e de Bantú, no Sul da África, concluíram que esses povos apresentavam, significativamente, menos acne do que seus descendentes que migraram para os Estados Unidos, ou seja, a partir do momento da ocidentalização destes.

    Com tais achados epidemiológicos, postula-se, então, que, ao contrario da alimentação cultural desses povos, o consumo frequente de carboidrato de alto índice glicêmico pode, repetidamente, expor adolescentes a hiperinsulinêmica aguda que, em consequência, influencia no crescimento epitelial folicular, na queratinização e, também, na secreção sebácea.

NUTRIÇÃO COMO ACELERADOR DA MATURAÇÃO SEXUAL E DESENCADEANTE DA ACNE

A melhora da nutrição populacional tem sido associada à maturação sexual precoce e ao desenvolvimento da acne em jovens. Estudos demonstram que adolescentes com hábitos de ingestão de alimentos com baixo índice glicêmico apresentam atraso na menarca, semelhante ao que ocorre em atletas e bailarinas.  Em 1970, a primeira menarca ocorria por volta dos 12 anos, ao passo que, em 1835, era em torno dos 16 anos de idade.

Em um estudo com 871 meninas, concluiu-se que o quadro comedoniano grave foi mais prevalente em meninas com menarca precoce e com altos níveis de diidroepiandrosterona (é um hormônio esteroide natural produzido a partir do colesterol pelas glândulas suprarrenais).  Demonstrou-se, também, que a precocidade do desenvolvimento da acne comedoniana pode ser o melhor preditor, no futuro, da gravidade da doença. A prevalência e o prognostico da acne se correlacionam com a maturação sexual.

INFLUÊNCIA DA HIPERINSULINEMIA NA CONCENTRAÇÃO DE ANDRÓGENOS E NA PRODUÇÃO SEBÁCEA.

A hiperinsulinemia, por meio do aumento dos níveis de andrógenos, estimula a produção sebácea, que tem papel fundamental na acne. Uma restrição calórica extrema diminui drasticamente a taxa de excreção sebácea, a qual se reverte com a adoção de uma dieta normal.

CHOCOLATE: UM INOCENTE EQUIVOCADAMENTE CULPADO?

Chocolate tem sido especialmente incriminado como fator agravante no quadro de acne. Pacientes referem, com frequência, o surgimento de pústulas após poucos dias da ingestão de tal alimento. Em 1969, 65 indivíduos foram submetidos à ingestão diária de uma barra de 112 gramas de chocolate, rica em licor de chocolate e manteiga de cacau, por quatro semanas; após esse período, trocava-se o regime por barra-controle, de mesmo peso, sem licor de chocolate e manteiga de cacau, por mais quatro semanas. As lesões foram classificadas no inicio e no final do estudo em três categorias: pioradas (as lesões aumentaram em 30% no final do estudo), melhoradas (lesões diminuíram em 30% no final do estudo), inalteradas (as lesões se modificaram menos de 30%). Como não houve diferença significante entre ingestão das barras de chocolate e das barras-controle nas três categorias de classificação das lesões, os autores concluíram que “a ingestão de grandes quantidades de chocolate não interfere no curso da acne vulgar ou na composição do sebo”.

Para Cordain et al., o estudo acima faz uma conclusão equivocada. Na barra-controle, o cacau, na forma de manteiga e licor, foi substituído por gordura vegetal hidrogenada (28% do peso). Alem do mais, tanto a barra modificada quanto a barra-controle apresentavam altas concentrações de sucrose (53% e 44,3% do peso, respectivamente), o que predispõe a hiperglicemia e a insulinemia, fatores envolvidos no mecanismo de desenvolvimento de acne. Logo, para esses autores, o resultado do estudo não pode generalizar e pressupor que o chocolate não esta associado à acne, já que, na sua manufatura, estão incluídos outros ingredientes que poderiam estar implicados na etiologia da acne.
Em outro estudo, conduzido por Anderson, 2 pacientes que diziam não tolerar ingestão de chocolate, por piorar o seu quadro acneico, foram selecionados. Tais pacientes fizeram ingestão de grande quantidade de chocolate por sete dias consecutivos e nenhuma modificação na quantidade ou qualidade da acne foi notada. Infelizmente, nenhuma contagem de lesão pre-experimental ou pos-experimental foi relatada, não houve grupo-controle nem analise estatística do estudo e, em comparação com o estudo de referencia, o tempo de analise de ingestão de chocolate foi muito reduzido (uma e quatro semanas, respectivamente).

Embora com conclusões disparatadas, a teoria da relação da acne com o chocolate e quase que totalmente confirmada pelos achados clínicos obtidos por estudos bem desenhados e conduzidos com excelência por grupos de estudos em nutrição e nutrologia.

Em um estudo realizado por cientistas australianos, comparou-se o perfil plasmático após a ingestão de alimentos a base de chocolate com os mesmos alimentos sem esse produto. Surpreendentemente, detectou-se um aumento na insulinemia pos-prandial em adultos jovens magros que fizeram uso dos produtos achocolatados (media 28% maior); os maiores índices ocorreram com o leite achocolatado (media 48% maior que o leite não achocolatado) e com os enriquecidos com chocolate negro, em comparação com o branco (13% maior) A explicação para os achados do grupo australiano pode ser o fato de que o chocolate e rico em compostos biologicamente ativos, como cafeína, teobromina, serotonina, feniletilamina, triglicérides e ácidos graxos canabioides-like, os quais aumentam a secreção, bem como a resistência periférica a insulina. Alem disso, os aminoácidos presentes no chocolate (como a arginina, a leucina e a fenilalanina) são extremamente insulinotropicos quando ingeridos com carboidratos; outros aminoácidos (valina, lisina e isoleucina), encontrados em outros tipos de alimentos, principalmente, os ricos em lactose, podem gerar, também, tal comportamento plasmático.

Com base no exposto acima, não seria impertinência sugerir que a ingestão de alimentos a base de chocolate pode, sim, ter relação com o quadro clinico da acne vulgar. Um dado relevante merece ser ressaltado: as barras de chocolate comerciais, especialmente, as que apresentam teor lácteo elevado, tem grandes quantidades de carboidratos (açucares refinados, portanto, possuem elevado índice glicêmico), os quais aumentam as taxas plasmáticas pós-prandiais de IGF e da proteína liga Dora de IGF (IGFBP), assumindo, também, um perfil insulinotropico. Aos que se convenceram do papel comedogenico dos alimentos com alto índice glicêmico fica a sugestão de observar.


Postado por: Christiana Nastari

Referência:
COSTA, A.; LAGE, D.; MOISÉS, T.A. Acne e dieta: verdade ou mito?. An Bras Dermatol.;85(3):346-53, 2010.

Nenhum comentário:

Postar um comentário