Pensar a prática da ginástica no dias de hoje nos remete à práticas competitivas e excludentes, práticas com fins estéticos, na busca pela saúde e qualidade de vida. Por isso, precisamos ampliar nosso olhar para esta prática corporal na perspectiva de conhecermos outras atividades que possam proporcionar o lazer e o divertimento em uma perspectiva lúdica, inclusiva e alegre.
Antes de sua sistematização no século XIX, a ginástica, englobava práticas como: jogos populares e da nobreza, acrobacias, saltos, corridas, exercícios militares de preparação para a guerra, esgrima, equitação, danças e canto. A ginástica como “arte de exercitar o corpo nú”; nú na possibilidade de ser livre, lúdico, prazeroso e despido de práticas direcionadas.
Em prol de finalidades como desenvolver a saúde, regenerar a raça, força para a guerra e para a indústria, moralizar, civilizar e padronizar. A ginástica foi sendo sistematizada em um movimento denominado de Movimento Ginástico Europeu, onde a ginástica acabou cedendo o lugar do lúdico para o cientifico “formatado”. A ginástica cientifica inaugura, portanto, o processo de “aprisionamento das formas/linguagens das práticas corporais” pelos círculos científicos europeus.
A ginástica, então, passa a ser apresentada como produto acabado e comprovadamente científico. Radicaliza, no universo das práticas corporais existentes, a visão de ciência como atividade humana capaz de controlar, experimentar, comparar e generalizar as ações de indivíduos, grupos e classes. [...] A ginástica cientifica se apresenta como contraponto aos usos do corpo como entretenimento, como simples espetáculo, pois, trazia como princípio a utilidade de gestos e a economia de energia.
Diante do exposto pretendo refletir sobre a ginástica e suas significações lúdicas, esportivizada, performática, competitiva, formativa e espetacular; apontando a Ginástica para todos como alternativa para o lazer e diversão bem como oportunidade de se repensar o homem como ser histórico, social e cultural.
A defesa em favor da prática dos exercícios ginásticos exercida a partir dos argumentos médicos, especialmente as representações atreladas aos discursos da Higiene, também aparecem na cidade. A
ginástica nesta perspectiva era defendida a partir das finalidades de “regenerar a raça promover a saúde, desenvolver a vontade, a coragem, a força, a energia de viver e, finalmente, desenvolver a moral”.
Infelizmente essa imagem da ginástica cientifica ainda permea nossa sociedade, a ginástica ainda aparece vinculada a conquista da saúde, focando o homem como um ser meramente biológico, sem história e sem cultura.
Desta forma, sem se preocupar com o ser histórico, social e produtor e reprodutor de cultura, ginástica tem se focado em reforçar estereótipos de corpos belos, másculos.
Penso que a relação entre indivíduos e a ginástica a não deve ser apenas esta focada no ser biológico, precisamos estar atentos à participar e socialização de crianças, jovens, adultos e idosos (seres sócio, históricos e culturais) na perspectiva do lazer, do entretenimento, da diversão, da educação, entendendo o homem dentro de suas múltiplas capacidades.
Infelizmente em relação à ginástica, o que se apresenta em nossa sociedade são as ginásticas competitivas, esportivizadas e veiculadas pela mídia; principalmente a ginástica rítmica, ginástica artística, ginástica aeróbica, ginástica de trampolim, entre outras.
Dentro desta perspectiva precisamos pensar a Ginástica para Todos como uma possibilidade de orientação para o rompimento desta hegemonia competitiva, e respeitando o espaço da cultura corporal em uma prática corporal que é marcada pela união de todas as ginásticas, ginástica em suas bases, ginástica simples que permite a participação de todos sem limites de idade e principalmente, respeita as vivências e experiências de seus participantes atrelado ao respeitando da cultura, do ser histórico e social, estimulando o prazer e a diversão.
A Ginástica para Todos pode ser realizada utilizando ou não materiais (oficiais ou improvisados), devendo ser orientada para o lazer e não para a competição, podendo ser elaborada para uma apresentação/demonstração onde o foco principal não é o produto final e sim o processo de transformação pelo qual os participantes vivenciaram até a conclusão do trabalho/ apresentação.
Os objetivos desta ginástica devem ser orientados para além de favorecer a saúde, a socialização e estimular a prática de atividade física, deve contribuir para incitar a criatividade, a desconstrução e resignificação de gestos motores padronizados, contribuindo para o bem estar físico, psicológico de seus praticantes.
Esta prática gímnica faz parte da FIG (Federação Internacional de Ginástica), e nesta instituição é caracterizada como uma atividade orientada para o lazer, trabalhando no campo da ginástica com e sem aparelhos, que envolve danças, jogos, conforme as preferências nacionais e culturais.
A Ginástica para Todos por ser orientada para a não competição, se situa em um lugar diferente daqueles ocupado pelas ginásticas competitivas, esta propicia o autoconhecimento e a reflexão sobre o corpo.
Esta forma de ginástica abre um novo horizonte nas possibilidades de práticas corporais por ser inclusiva permitindo um grande número de participantes independente de idade, gênero, raça, cor, credo, aptidão física, técnica, material e vestuário.
Por dialogar com outras praticas corporais a Ginástica para Todos não deve perder o seu foco que são as manifestações gímnicas: exercícios acrobáticos, elementos corporais, exercícios naturais e construídos, praticados sem ou com ou/e em aparelhos.
A idéia de construção de um espetáculo também esta inserida no contexto da Ginástica para Todos assim, as apresentações/demonstrações nos festivais, encontros, fóruns, comemorações e festas devem refletir a proposta de trabalho que é realizada dentro do grupo de Ginástica para Todos.
É pensando no espetáculo e nesta possibilidade de ludicidade que a Ginástica para Todos nos permite trabalhar na perspectiva do lazer que possui um duplo aspecto educativo, ou seja, é veiculo privilegiado de educação, e que para as práticas de lazer faz-se necessário o aprendizado, o estimulo e a iniciação aos conteúdos culturais, que possibilitam a passagem de níveis menos elaborados, para mais elaborados, procurando superar o conformismo pela criticidade e criatividade.
Assim, a Ginástica para Todos atende não só as perspectivas educacionais voltadas para o lazer, divertimento e ludicidade, como estimula a criatividade e a criticidade de um ser humano que é biológico, social, cultural e histórico.
A Ginástica pata Todos também pode ser inserida no ambiente escolar como parte integrante dos conteúdos da cultura corporal atrelada à disciplina de Educação Física.
Por cultura corporal entendo a educação física em um aspecto mais amplo onde o indivíduo não é apenas biológico, ele é um ser histórico, sócio e cultural. Produtor e reprodutor de cultura, significados e significações que se imbricam de forma dialética.
Atualmente, a ginástica como conteúdo das aulas de Educação Física Escolar é pouco disseminada, e nas poucas vezes em que ocorrem aulas de ginástica são na perspectivada competitiva, performática e esportivizada como a ginástica artística e a ginástica rítmica.
Ao considerarmos possibilidade de demonstração da Ginástica para Todos, devemos estar atentos pois ela se vincula a um processo de produção e não apenas um “produto”.
No processo de produção devem ser privilegiadas as experiências e interesses dos alunos, o trabalho coletivo, cooperativo e solidário, para que possam participar do processo de composição coreográfica e compor em co – autoria com outros sujeitos, buscando novas interpretações, novas leituras, novos significações antes desconhecidas.
Neste sentido, pensar o corpo como produtor e consumidor de cultura num processo dialético de ser premissa da disciplina de Educação Física no interior da escola, pensando a sociedade, seu corpos, suas formas, produções e reproduções; a Ginástica para Todos vem para nos auxiliar neste processo.
Postado por: Heleuza Silva e Priscila Lumazini
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